quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Procura-se um amigo para o fim do mundo (Seeking a friend for the end of the world)


Procura-se um amigo para o fim do mundo (Seeking a friend for the end of the world) – 2011 – USA

Direção: Lorene Scafaria

Roteiro: Lorene Scafaria

Depois de ter colaborado no roteiro do simpático e divertido Uma Noite de Amor e Música, Lorene Scafaria estreia na direção desse igualmente simpático e também emocionante Procura-se um amigo para o fim do mundo.

Dodge (Steve Carell) é um homem de meia idade solitário que foi abandonado pela esposa. Diante do fato de que um asteroide chamado Matilda irá atingi a terra em três semanas e destruir toda a vida no planeta, Dodge se vê na necessidade de encontrar um amigo(a) para juntos passarem o fim do mundo. Um casal de amigos seu tenta juntá-lo a uma conhecida, mas a tentativa acaba sedo frustrada. Até que aparece então na janela de seu quarto a sua vizinha de baixo, a intensa Penny (Keira Knightley) numa crise de choro causada pelo seu namorado desequilibrado. A partir dali, os dois se toram amigos e partem numa jornada juntos. Penny quer pegar um avião para ver seus pais em Londres antes do fim do mundo e Dodge quer reencontrar sua antiga namorada do colégio, que lhe enviou uma carta dizendo que sempre o amou.

O roteiro se desenvolve como um road movie dos mais empolgantes, mesmo com o fato de os personagens estarem presenciando o fim do mundo e todas as consequências que isso traz. As rebeliões e a queda de qualquer organização social, os suicídios, a perda dos valores morais da sociedade e a perda do sentido da vida, de forma geral.

Esse assunto que já foi retratado no cinema de várias vezes, de forma dramática na maioria das vezes, aqui assume um tom sarcástico e irônico. Cada grupo de pessoas que os dois vão encontrando pelo caminho apresentam o seu próprio modo de enfrentar o fim dos tempos, o que rende momentos muito divertidos e também que nos fazem refletir. Saber o dia de sua própria morte não é algo natural, como diz certo personagem no filme. Imagine o mundo todo sabendo disso ao mesmo tempo. Toda a concepção de vida e os seus objetivos como conhecemos deixa de existir. Vemos então diretores de empresas oferecendo cargos de presidentes para qualquer funcionário, pais dando bebidas alcoólicas para os filhos, pessoas casadas deixando a fidelidade de lado, afinal, porque ser fiel se o mundo vai acabar? Não tem como não rir diante desse caos com o tom que o filme retrata o assunto. E não tem como não parar para pensar nos seus próprios valores de vida e objetivos. Como eles mudariam se você soubesse o dia de sua morte? O que você faria nos seus últimos dias? Com quem passaria? São perguntas que o roteio tenta responder através de seus perturbados e carismáticos personagens.

Steve Carell está muito bem, com uma performance contida, porém bem humorada e com ótimo timing cômico como de costume. A surpresa fica por conta de Keira Knightley, atriz dramática desde o início de sua carreira, mostra que é versátil para fazer também comédia. Ela acaba exagerando um pouco nas caretas, mas não é uma falha que atrapalhe o espectador a se conectar com sua personagem e se importar com ela. Além de acha-la extremamente engraçada, é claro.

O maior problema do filme é o seu terceiro ato, que faz com que o longa perca um pouco o foco da narrativa. Os objetivos dos protagonistas passam a não ser tão claros, o que em si não é um problema, mas o fato de mudarem de opinião sobre o que eles queriam para o fim do mundo soa um pouco forçado e farsesco. O envolvimento dos dois, que deveria ser algo muito natural, soa um pouco fora de contexto. Não que não dê pra acreditar no interesse de um para com o outro, mas fica uma dúvida: ‘e o objetivo inicial deles? Não importa mais?’ Salvo esse pequeno grande deslize, o filme cativa, faz rir e emociona.

A história de amor dos dois só se iniciou e ocorreu daquela maneira porque eles estavam diante do apocalipse. Tudo foi intenso, importante e eterno. Fez-me pensar no quanto o tempo que temos é importante, porque afinal, é dele que a vida é feita. Fez-me pensar também em como tenho gastado meu tempo e se essa forma tem sido digna da oportunidade que me foi dada.

Nota: 7,5

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

007 – Operação Skyfall (Skyfall)


007 – Operação Skyfall (Skyfall) - Reino Unido

Direção: Sam Mendes

Roteiro: Neal Puvis, Robet Wade e John Logan

A decisão de escolher Daniel Craig para encarnar o mais famoso agente do Cinema dividiu opiniões. A minha sempre foi positiva. Acho que ele trouxe outra dinâmica ao personagem, bem diferente do seu antecessor, Pierce Brosnan. Craig nunca sorri, exala masculinidade e virilidade, e apresenta uma energia incrível nas cenas de ação. Sem mencionar seu carisma e talento na pele do agente. Depois do ótimo Casino Royale e do fraco Quantum of Solace, a franquia recupera o fôlego com esse excelente Skyfall.

Sam Mendes, experiente diretor de dramas ambiciosos como Beleza Americana, Estrada para perdição e Foi apenas um sonho, traz outra abordagem para o universo de Bond. Mendes investe mais no desenvolvimento dos personagens e nos relacionamentos entre eles, deixando um pouco de lado as sequências de ação ininterruptas. Não que o filme não possua ação. Muito pelo contrário. Já começa com uma sequência incrível envolvendo Bond, as ruas da Turquia, um HD que precisa ser recuperado e um trem. A ação continua com o tom mais realista e com edição e direção mais cruas, como nos dois longas anteriores, mas tem os seus toques de exagero e coisas “impossíveis” sendo realizados por Bond que de forma alguma afetam o filme. Apenas assumem o charme que a série sempre teve. Afinal, ele é o James Bond e já estamos acostumados a vê-lo fazendo coisas improváveis na tela. Depois dessa sequência, mergulhamos (literalmente) numa maravilhosa abertura gráfica, como é de costume na série, embalada pela excelente canção Skyfall.

O roteiro dá mais destaque ao relacionamento de Bond com M (a sempre soberba Judi Dench), o que traz uma dinâmica interessante ao longa, e faz com que possamos entender melhor o funcionamento da misteriosa agência MI6. Dado como morto, Bond se apresenta à M depois que a base do MI6 sofre um violento atentado terrorista. Depois de uma investigação mais minuciosa, descobre-se que o autor do atentado conhece o MI6 melhor do que eles esperavam. Bond é então enviado por M para descobrir a identidade do autor do atentado e recuperar o HD roubado, mesmo ela sabendo que Bond não se encontra fisicamente apto para a tarefa.

Mendes prova que pode sim dirigir um filme de ação com competência, e não somente dramas. Ele mantém o ritmo da narrativa sempre ágil e prende o interesse do expectador. É muito frequente acontecer em filmes de ação/espionagem não ficar muito claro para o expectador a complexa rede de interesses dos personagens, as reviravoltas da trama e os objetivos de cada um. Mas isso felizmente não acontece com Skyfall, graças à direção competente de Mendes e o roteiro sólido e bem escrito. Tomando a decisão de dar mais importância aos personagens e seus relacionamentos, Mendes acerta em cheio, mas ainda assim mostra que é versátil e pode dirigir sequências de ação como um diretor experiente no gênero, ou até melhor. Diferente de Michael Bay e outros do tipo, que apostam na câmera que treme o tempo todo e nos cortes com frações de segundo para conferir um tom de “ação frenética” que muitos gostam, mas que pra mim é um erro, Medes aposta na direção limpa e edição sem cortes muito rápidos. Decisão sábia. Eu consegui entender, acompanhar perfeitamente e me emocionar com a ação que ocorria na tela, o que é um feito digno de nota.

A trilha sonora pontua perfeitamente a narrativa. Toda vez que o tema clássico da séria surge, não tem como evitar a empolgação de antecipar a ação que está por vir. A direção de arte e os efeitos visuais são, como sempre se pode esperar da franquia, incríveis e eficientes.

Elogios devem ser feitos à atuação original e divertida de Javier Bardem como o vilão Raoul Silva. De longe um dos vilões mais memoráveis da série, Raoul impõe medo e respeito toda vez que aparece em tela, e sua dinâmica com Bond é imprescindível para nos convencer de suas motivações. Ele oscila entre o débil, o lascivo, genial e extremamente perigoso e desequilibrado. Seu diálogo com Bond é hipnotizante. Prova de que estamos assistindo ao trabalho de dois atores talentosos.

O longa não tem de fato uma bond girl como os anteriores, mas que não fez muita falta também. O centro da narrativa foi Bond versus M, Bond versus Raoul e Bond versus ele mesmo, o que já era coisa demais para o 007 lidar.

Espero que a série continue nesse mesmo nível de qualidade narrativa e dramática, se não ela corre o risco de se tornar apenas uma franquia de filmes de ação genéricos com um protagonista de nome famoso.


Nota: 9

O segredo de Vera Drake (Vera Drake)


O segredo de Vera Drake (Vera Drake) – Reino Unido – 2004

Direção: Mike Leigh

Roteiro: Mike Leigh

Vera Drake (Imelda Staunon) é uma senhora amável, que vive com sua família no subúrbio de Londres na década de 1950. Completamente devotada a cuidar de todos ao seu redor, ela vive para seu marido e os seus dois filhos adultos, além de se mostrar sempre sorridente e prestativa para seus vizinhos e amigos mais próximos. Não demora muito tempo de projeção e descobrimos outra atividade que ocupa o seu tempo: Vera realiza abortos em jovens sem recursos com uma bomba de água, desinfetante e sabão, num procedimento que ela chama de “ajudar jovens moças”.

A direção de Mike Leigh é muito hábil em estabelecer com pouco tempo de filme a personalidade de Vera Drake, sua rotina com sua família e amigos e o tom da narrativa. Conhecemos a família Drake com poucas cenas acompanhando as tarefas diárias de trabalho de seus membros e suas refeições em casa. Com planos muito fechados e constantemente enfocando seus atores de costas, Leigh consegue mostrar o quão pequeno é o apartamento dos Drake e o quão próximos e íntimos eles são uns dos outros, o que torna ainda mais chocante quando mais tarde o segredo de Vera é revelado. Outro ponto importante que Leigh faz questão de enfatizar é a frequência dos procedimentos de aborto feitos por Vera, sua precariedade, os riscos que oferecem às moças e a naturalidade com que ela os encara: como se tivesse cuidando de um doente ou uma criança machucada. Leigh faz questão de mostrar com detalhes cada um deles. E algo que achei genial foi o contraponto que Leigh estabelece com a água aquecida na chaleira tanto para o aborto quanto para o chá que Vera serve às suas visitas. Mostra com talento a ambiguidade das atividades de Vera. Com o mesmo sorriso ela serve chá para suas visitas e realiza um aborto.

O ritmo da narrativa jamais se perde porque Leigh conta a história num crescendo constante, causando sempre mais interesse no expectador sobre quais serão as consequências da conduta da protagonista. Dois dos momentos mais tocantes do longa (ele tem muitos) são o pedido de casamento de um amigo da família à Nellie, filha de Vera, devido à singeleza e compaixão que sentimos por aqueles dois personagens tão acostumados à ter tão pouco na vida e o momento em que Vera é surpreedida pelos policiais em sua casa diante de toda a sua  família. Apenas nos olhos da personagem conseguimos entender tudo que ela sente no momento. Mesmo considerando superficialmente que só estava “ajudando moças em necessidade”, ela no fundo sabia que estava fazendo algo que não era certo (ou dentro da lei). E então chegamos à atuação de Imelda Staunon.

Imelda carrega o filme nas costas e responde a toda responsabilidade que a tarefa exige com perfeição. O brilhantismo de sua atuação é fundamental para o sucesso do filme. Uma atriz medíocre ou menos talentosa poderia fazer com que sentíssemos ódio de Vera não deixando claras as suas complexas motivações. Imelda faz com que sintamos simpatia por ela apesar de sua conduta colocar em risco a vida das moças, além do que também causou em mim (algo que acho genial quando acontece) a curiosidade para saber mais sobre o seu passado e o que a levou a adotar essa conduta, visto que logo de início sabemos que ela não cobra pelo procedimento que induz o aborto. Imagino que ela deve ter passado pela mesma situação em que se encontram as moças quando era jovem. Ou tenha passado por algo parecido em sua família... Mas é só uma divagação sobre um personagem que conseguiu atingir essa complexidade.

O roteiro não entra no mérito da legalidade do aborto e muito menos na discursão religiosa ou moral de certo e errado. O tema está ali presente para o espectador lidar com ele e para transtornar a vida dos personagens. E Leigh não poupa nenhum deles. Todos sofrem as consequências dos atos de Vera de forma brutal, desde a moça que se submeteu ao aborto e quase morreu e sua mãe que é obrigada a depor na polícia até a família de Vera, que desmorona diante do fato de ter seu membro mais idôneo sendo levado para a cadeia e principalmente para Vera, que passa pela humilhação de ter sido desmascarada em seu lado mais sombrio até então desconhecido por quase todos. Outro momento extremamente tocante do longa é quando Vera se vê obrigada a contar para seu marido o porquê de estar presa. Não escutamos nenhuma palavra sair de sua boca, mas a vergonha e humilhação estão estampadas em seu rosto.

O segredo de Vera Drake é um grande filme, que além de arte e entretenimento de alto nível, ainda ganha pelo fato de levantar uma discursão sobre um tema que ainda precisa muito ser dissecado e debatido.

Nota: 10

segunda-feira, 23 de julho de 2012

Intocáveis (Intouchables)


Intocáveis (Intouchables) – França – 2011

Direção: Olivier Nakache e Eric Toledano

Roteiro: François Cluzet, Omar Sy e Anne Le Ny

Intocáveis é uma grande prova de que o Cinema não precisa contar uma história complexa para ser ambicioso e tocante, ou muito menos precisa contar uma história simplória e vazia para entreter o público. Dois homens vindos de mundos tão diferentes se encontram em momentos críticos de suas vidas e acabam por mudar o rumo de suas histórias. Com essa premissa Olivier Nakache e Eric Toledano imprimem tanta autenticidade no seu filme que ele passa conceitos fortes, relevantes e emocionantes para o espectador que tornam a obra inesquecível.

Driss (Omar Sy) é um imigrante africano em Paris que tem ficha na polícia, é semianalfabeto, pobre, desempregado, desajustado na sua família e vive de previdência social. Philippe (François Cluzet) é um magnata milionário, crítico de arte e tetraplégico que perdeu a esposa ainda jovem e agora depende de seus empregados para fazerem tudo para ele. Entrevistando candidatos à vaga de seu assistente pessoal, Philippe conhece Driss que estava apenas interessado em pegar a assinatura de mais um empregador o dispensando para poder continuar a receber a previdência social. Philippe acha o senso de humor e personalidades de Driss interessantes e decide contratá-lo. O choque de cultura e realidades inicial é grande, mas os dois começam a desenvolver uma amizade peculiar que acaba por mudar a vida de ambos.

Apesar de tratar de temas pesados (um homem tetraplégico viúvo e um negro marginalizado pela sociedade) o filme encara tudo com leveza e bom humor. Se fosse um drama que as pessoas tivessem que sacar o lenço a cada dez minutos, não funcionaria tão bem como funciona. É hilário ver Driss achar um absurdo Philippe querer pagar 30.000 euros num quadro branco com uns borrões de tinta azul. A princípio Philippe não entende a ignorância de Driss relacionada à arte, mas depois acaba por ver do ponto de vista do amigo, quando este pinta um quadro tentando imitar este outro de 30.000 e pergunta a Philippe quanto ele pagaria. Depois, o melhor é ver Philippe tentando vender o quadro para um amigo como se fosse pintado por um artista renomado cobrando 11.000 euros com um sorriso sarcástico nos lábios.

Um ponto chave (divertido e lindo) da narrativa é a festa de aniversário de Philippe, no qual todos os seus parentes vêm para comemorar, ao som de uma orquestra de câmara em uma cerimônia formal. Philippe solicita um show particular pra ele e Driss no qual ele tenta ensinar apreciação para Driss, enquanto este faz comentários divertidos como “Bach devia usar essa para pegar garotas”. Por fim chega a vez de Driss mostrar sua música para o amigo, uma batida agitada que faz com que todos na festa dancem e se divirtam. Philippe simplesmente se deleita nesse momento.

Uma metáfora incrível no filme é a associação das dores noturnas de Philippe com o seu estado de imobilidade. É como se seu corpo sofresse pelo fato de estar paralisado e não poder proporcionar prazer de qualquer forma para o seu dono. E mal percebemos que Philippe não sente mais essas dores noturnas depois de certo tempo de convivência com Driss até que o segundo se ausenta de sua vida e as dores retornam.

Um aspecto importante da narrativa é a arte. Além de Philippe ser um crítico e entendedor, Driss passa a ver o mundo de outra forma em parte por causa da arte, ao mesmo tempo em que também Philippe passa a enxergar a própria arte diferentemente. Em certo ponto alguém diz: “sabe por que as pessoas investem em arte? Porque é a única coisa que elas de fato deixam.” Essa mudança de pensamento de Philippe é mostrada em uma sessão de ópera à que eles vão: assim que as cortinas se abrem e Driss vê um homem vestido de árvore cantando em tenor lírico, ele tem uma crise de riso que contagia o próprio Philippe, que não se importa de estar quebrando protocolos e incomodando os outros. Algo que para ele seria inaceitável tempos antes.

Ambos são homens estigmatizados pela sociedade. Um é negro, imigrante e de classe baixa, o que já é mais do que suficiente para leva-lo a sofrer pré-julgamentos. O outro é tetraplégico e solitário, o que faz com que sempre inspire a piedade dos outros. Ambos só queriam ser tratados como iguais pelo resto do mundo, sem rótulos e preconceitos. Philippe em certo momento diz para seu amigo que o repreende por ter contratado uma pessoa como Driss: “sabe por que eu gosto dele? Ele sempre se esquece de segurar o celular para eu falar. Ele esquece que eu preciso”.

A influência de um na vida do outros os tornou intocáveis pelo mundo exterior, como sugere o título. Philippe sai de um ponto na vida em que pensava “é mais difícil viver sem minha esposa do que nessa cadeira de rodas” para um momento em que começa a pensar que pode ser feliz novamente. Driss parte de uma vida sem nenhum futuro para uma situação em que se vê ajudando seu irmão adotivo mais novo.

As atuações são incríveis. Omar Sy cria um Driss espontâneo, criativo, bronco, mas ao mesmo tempo adorável, às vezes irritante, mas indispensável. François Cluzet encarna Philippe de forma muito contida e expressiva, protagonizando os momentos mais tocantes do longa. Pelo fato de estar interpretando um paraplégico, sua atuação fica muito limitada, mas tudo que precisamos saber sobre o personagem está em seus olhos.

Intocáveis tem que ser visto e revisto pelos amantes de Cinema. É simples, mas ambicioso, emocionante, porém divertido, realista e atemporal. Seres humanos são iguais em suas essências. É isso que o filme prova com brilhantismo artístico.

Nota: 10

P.S.: Existe um projeto de fazer um remake americano. Sempre acho remakes desnecessários.

Valente (Brave)


Valente (Brave) - EUA – 2012

Direção: Mark Andrews, Brenda Chapman e Steve Purcell

Roteiro: Brenda Chapman, Mark Andrews, Steve Purcell e Irene Mecchi

Com uma carreira quase impecável, os estúdios Pixar já provaram para o mundo que não é só de adaptações de histórias dos irmãos Grimm que vivem os filmes de animação. Sempre apostando em roteiros originais com personagens fora do convencional, John Lasseter e sua equipe já encantaram a todos com a trilogia Toy Story, Os incríveis, Up – altas aventuras, Ratatouille entre outros. Depois de um fraco Carros 2 (porque faze uma continuação?) esse novo Valente surge como um filme interessante, mas nada extraordinário como estamos acostumados a esperar do estúdio.

Princesa de um reino em um lugar e tempo desconhecidos para mim (imagino que seja uma Europa Medieval), Merida desde pequena mostra preferência por atividades como cavalgar, arco e flecha, entre outros tipos de desafios que envolvem a natureza e o seu físico, pouco convencionais para uma moça na sua posição de princesa e para a ambição de sua mãe, a rígida rainha Elinor, que tem planos maiores para a garota, que é formá-la para ser uma perfeita esposa e rainha para seus pretendentes. Diante de um casamente arranjado com um dos três príncipes nada interessantes para Merida (e para ninguém, eu acho), ela deseja apelar para a magia de uma misteriosa e divertida bruxa da floresta, que lhe oferece a opção de mudar a sua mãe para que esta deixe Merida fazer suas próprias escolhas. O plano não dá muito certo, transformando Elinor em um gigante urso, que passa a ser perseguido por seu pai, e as comitivas dos três reinos de seus pretendentes. Para piorar, se a situação de Merida e sua mãe não for solucionada até o por do sol do segundo dia depois do início do encanto, Elinor será um urso para sempre.

Merida é uma protagonista muito interessante. Espírito livre e vivaz, ela só ansiava por poder fazer suas próprias escolhas, o que demonstra que ela de certa forma era feminista (sem saber) e uma garota a frente de seu tempo. Só o fato de a Pixar criar um longa com uma protagonista mulher e feminista já é algo notável. Mas o triste é que o que é notável fica por aí. As possibilidades criadas pelo primeiro ato são desperdiçadas por uma história um tanto rasa e com uma resolução forçada, criada apenas para cumprir o papel.

O centro da narrativa a meu ver deveria ser o relacionamento de Merida e Elinor e os conflitos que a diferença de personalidades e de gerações entre as duas gera. E de fato o é. Mas o filme perde o foco ao longo da projeção apostando em gags de humor físico que são engraçadinhas e agradam ao público infantil que é o grande alvo do estúdio, mas as vezes soam forçadas e fora de hora. Outros dois aspectos muito desnecessários que poderiam ser retirados do filme sem nenhuma alteração são as luzes mágicas que surgem na floresta sempre que é conveniente e a subtrama envolvendo a bruxa e uma antiga lenda do passado que ressurge quase que nos minutos finais.

Elinor e Merida são mãe e filha que se amam, mas tem suas diferenças para acertar. As possibilidades de ideias para serem exploradas aí são enormes: feminismo, conflito de gerações, relacionamentos familiares, compreensão com as diferenças, tolerância, entre outros; mas o roteiro deixa tudo isso só na promessa. A densidade dramática fica por conta de poucas cenas no final no terceiro ato, e é quebrada por frases como “siga seu coração”, e outras coisas ao estilo Disney. Esse fato me deixa extremamente triste, visto que a Pixar sempre presou por passar mensagens relevantes apostando na força de suas boas histórias e de seus personagens bem desenvolvidos, sem apelar para lições de moral faladas na conclusão dos filmes.

Elogios devem ser dados à parte técnica, como sempre. O visual das “paisagens” e “locações” impressiona, assim como o figurino e aparência física dos personagens. Os rostos são extremamente expressivos e os movimentos parecem perfeitamente naturais. O único problema com o visual do filme (que foi comprovado pela opinião de outras pessoas, não só a minha) é a escuridão das cenas que se passam à noite ou no interior de algum ambiente escuro. É claro que o óculo 3D escurecem a fotografia, mas isso tem que ser levando em conta pelos realizadores. Parece um erro muito primário para mim. A trilha sonora encanta e traz o clima do tempo e do lugar. As duas ou três canções que tocam ao longo do filme passam um pouco despercebidas. Talvez seja porque eu as escutei em português, mas acho improvável. As melodias são genéricas e as letras... nem me lembro. Acho que o fato de o roteiro ter sido escrito por QUATRO pessoas e a direção ser assinada por TRÊS delas prejudicou o resultado final.

Mas nem de longe Valente é um filme que não merece ser visto. Na verdade, qualquer filme merece ser visto porque ele pode comunicar algo, por pior que seja. É a melhor animação do ano até o momento, o que não significa muito.

Nota: 7,0

P.S.: Adorei a companhia de Daniele, Vagner, Heitor, Sophia e Phillipe.

Retorno às atividades


Depois de um hiato bem grande sem postar aqui, estou voltando hoje com um texto sobre Valente. Espero que as postagens sejam mais frequentes (eu tenho essa dificuldade de manter o ritmo por conta do trabalho), porque sinto grande prazer em escrever sobre filmes/livros e ler os comentários dos leitores.
Abraços.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

1984

Autor: George Orwell

Editora Companhia das Letras, 2009. 416 páginas.


Quando li num texto na internet que dizia que "uma pessoa que não conhece o trabalho de George Orwell não pode dizer que gosta de literatura", tratei logo de corrigir o erro, do qual me envergonhei internamente, e comprei a obra que todos consideram máxima do autor: 1984.

É impossível falar do livro sem citar o contexto no qual foi escrito. Foi publicado no ano de 1949, em pleno fim da Segunda Guerra Mundial, quando o mundo entrava numa Guerra Fria que duraria muitos anos e começava a se dividir em duas partes: Capitalista e Socialista. Orwell criou o que se costuma chamar na literatura de utopia, mas ao contrário das utopias comuns que apresentam uma perspectiva e previsão geralmente positivas do futuro, Orwell apresenta uma visão extremamente negativa, na qual ele apresenta sua versão baseada na interpretação da realidade na qual ele estava inserido. Ele também não deixa de mostrar sua visão pessimista da humanidade. Essa forma de utopia negativa é conhecida também por distopia. Essa negatividade é interessante e tem uma importância enorme para abrir os olhos do leitor para aquilo que poderia acontecer ou já estava acontecendo com o governo e a sociedade se nada fosse feito pelos cidadãos, e que também se mostra tão atual nos dias de hoje; principalmente com a existência de inúmeros reality shows na tv aberta e fechada que tomam a forma e ideologia que Orwell descreve (soando como uma espécie de “previsão” acertada) e que tem a mesma função da teletela descrita no livro, de controlar e alienar completamente os cidadãos; outro exemplo que mostra a atualidade da obra de Orwell é a presença constante de guerras no mundo atual desde a Segunda Grande Guerra, as ditaduras que se espalham e crescem ao redor do mundo,  a imprensa tendenciosa e imparcial e a arte alienada, que não se importa de informar e conscientizar as pessoas. Até mesmo o nome do reality show mais famoso no Brasil e no mundo é inspirado no livro de Orwell, o que é uma grande ironia.

Winston é o personagem principal que representa a sociedade e também cada um de nós. Vive sozinho num cubículo, cercado de teletelas (câmeras do governo que o vigiam dia e noite) em alguma cidade não citada da Oceânia, uma espécie de continente que também forma uma unidade política. O mundo é divido em três dessas unidades: Oceânia, Lestásia e Eurásia, que vivem em guerra entre si ou às vezes aliadas, como descobrimos mais à frente no livro. A identificação do leitor com Winston é imediata, porque apesar de ter uma narrativa ágil e interessante, o livro não contem muitos acontecimentos em si. A desenrolar dos fatos se passa mais na mente de Winston do que no mundo externo. Sua inquietação e insatisfação com o sistema totalitário imposto pelo partido e pelo Grande Irmão (Big Brother) despertam em nós uma simpatia enorme, porque com nossas mentes e vidas livres de tantas cadeias como às que ele estava submetido, imagino que o desejo de liberdade de Winston é exatamente o mesmo ou ainda maior, do que o que teríamos no lugar dele. A realidade que ele conhecia era aquela, mas algo no fundo de sua mente dizia que ele não tinha nascido para viver daquela forma. A necessidade de liberdade é um dos instintos mais básicos dos seres humanos.

Tudo que ele queria era encontrar alguém com o mesmo desejo de mudança, de causar uma revolução que ele. Ele não sabia exatamente como ou por onde começar, e nem se de fato existiam outras pessoas com o mesmo pensamento que ele ou se ele estava simplesmente delirando. Quando encontra essas pessoas, Winston entra no processo de sair do campo das ideias e passa a fazer algo de concreto. A parte que ele tem acesso ao livro de uma sociedade secreta que explica o sistema de governo do Grande Irmão é simplesmente incrível. Não consegui parar de ler até o fim do livro.

Mas o mais importante do livro mesmo é como Orwell entra no âmago da relação governo/sociedade. Ele disseca e analisa exaustivamente e de todos os ângulos possíveis o poder de influência das autoridades na vida particular de cada indivíduo. Através da imprensa, da arte, da tv, propaganda e publicidade, vida pessoal, amorosa, familiar até mesmo amizades. Claro que grande parte das coisas descritas por ele na sociedade que ele imaginou não acontecem hoje em dia. Não em nosso país e não da forma como ele descreve, mas manipulação e censura da arte e imprensa é coisa que já foi vistas várias vezes ao longo da historia em qualquer governo totalitário, que objetivam, assim como na realidade alternativa de Orwell, manipular a opinião e o sentimento das pessoas. Chega a ser assustador você pensar que sua mente pode ser manipulada de forma tão inescrupulosa por terceiros para interesses próprios. Na maioria dos casos, o poder pelo poder, simplesmente. Uns dos piores frutos dessa manipulação nos dias atuais são fáceis de serem reconhecidos: nacionalismo exacerbado e terrorismo.

Minha visão de mundo mudou completamente depois da leitura de 1984. Acho que pessoas que acham que romances são alienadores e sua leitura é perda de tempo nunca leram nada ambicioso, complexo e profundo como 1984 e também, porque não, algo tão agradável de ler. É leitura obrigatória.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Trilogia "Millenium"

Terminei de ler a trilogia "Millenium". O terceiro livro "A rainha do castelo de ar" é simplesmente difícil de para de ler. A narrativa do primeiro adquire proporções épicas no segundo e terceiro livros envolvendo Lisbeth Salander e Mikael Blonkvist que acabam atingindo toda a Suécia e provando e que Lisbeth é uma grande vitima do Sistema desde criança. O julgamento no desfecho do livro é incrível. A forma de escrita de Stieg Larsson é crua e sem floreios de linguagem, mas a história não perde o ritmo em nenhum momento e nem o foco, o que eu admiro muito. Sem contar na qualidade das situações e arcos dramáticos que ele cria e na ação frenética e tensão que permeia todo o tempo. Recomendo.

Arte trapaceira: uma reflexão a partir de “Battleship – batalha dos mares”


Eu poderia fazer aqui um texto destroçando Battleship – batalha dos mares como eu fiz com Transformers – o lado oculto da Lua, mas ao invés disso, resolvi refletir um pouco sobre o Cinema norte americano e os caminhos que ele tem tomado nos últimos anos com o mais recente 3D ressuscitado por Avatar (2009) e porque não também refletir sobre as três últimas décadas, desde que os efeitos digitais (CGI) começaram a ser introduzidos no Cinema como ferramenta para criar aquilo que não poderia ser filmado da forma convencional com o ótimo O enigma da pirâmide (1985).

Desde que os Irmãos Lumière criaram em 1985 aquilo que viria a ser mais tarde o Cinema como o conhecemos como forma de Arte, não passou muito tempo para que alguém percebesse o potencial comercial da ferramenta para ele se tornar popular ao redor do mundo como forma de expressão artística e entretenimento (coisa que não vejo de forma negativa, visto que artistas precisam ser pagos pelo seu trabalho para poderem se dedicar às suas obras). Não há problema nenhum em uma arte se tornar comercial. Principalmente o Cinema precisa se pagar muito bem, visto que exige tantos recursos para sua realização (mesmo um curta metragem de três minutos pode custar milhões). Diferente da literatura, por exemplo, que só necessita de um arquivo de word em branco para acontecer.

Em qualquer forma de arte, quando um artista é desonesto e tenta simplesmente fazer um produto para ser vendido e fazer sucesso, aqueles que a consomem e que têm um mínimo de senso crítico conseguem perceber essa “trapaça” e falta de inspiração de cara. Não é incomum escutar músicas de um cantor pop que parecem ter sido feitas dentro de uma “fórmula” para o sucesso, com letras, instrumental e melodias genéricas. Não é incomum ver em salas alheias quadros que mais parecem cópias de outros, com paisagens bonitas, mas que não apresentam nada de novo, seja no traçado, nas cores, etc. E você não se surpreende quando vai à casa de outra pessoa e encontra um quadro praticamente idêntico ao visto anteriormente. Também não é raro ler livros com histórias “repetidas”, batidas, cheias de clichês, previsíveis, e com recursos narrativos que são verdadeiras bengalas do autor, na qual ele se apoia para esconder a falta de talento (vide Stephenier Meyer, Dan Brown e Nicholas Sparks). Imagino que desde que a arte existe, existe esse tipo de coisa. Mas quando vi Battleship – batalha dos mares pensei que Hollywood ultrapassou todos os limites.

Muitas vezes eu vi comédias românticas feitas com o único proposito de agradar ao público jovem e que eram um tanto vazias, mas me diverti muito (O melhor amigo da noiva, 2008 para citar uma); ou um filme de ação genérico que conseguiu capturar minha atenção e me prender na história e na ação em si (Salt, 2010). Não sou um cinéfilo chato que só assiste filmes “de arte” e despreza o Cinemão Hollywood que é feito com o propósito de arrecadar milhões. Mesmo esses longas podem conservar certa qualidade artística e ambição narrativa. Me lembro agora de Avatar (2009), já citado anteriormente no texto. A maior bilheteria da história, com orçamento estimado em torno de quinhentos milhões de dólares que, apesar de toda a publicidade que teve continua relevante. Hoje, passados quase três anos de seu lançamento, um tempo razoável para toda a poeira levantada em torno de si se assentar, o filme continua sendo importante, tanto pelo fato de ter estabelecido avanços na área dos efeitos visuais quanto em sua narrativa, porque conta uma história importante, que aborda conceitos profundos sobre a existência humana, filosofia e espiritualidade. E é um grande entretenimento!

Mas Battleship...

O filme é completamente vazio de conteúdo. Os personagens não são pessoas. São objetos usados pelo roteirista como desculpa para criar sequências de ação grandiosas com CGI na potência máxima. O roteiro é tão tolo que chega a não fazer sentido em vários momentos. Enfim, não é necessário ficar falando da mediocridade do filme. Mas tenho que reconhecer que um ponto positivo ele tem: há um plano-sequência incrível envolvendo uma fuga de um navio. Tenho que reconhecer que achei muito bom (vindo de alguém de gosta muito de planos-sequência).

Preocupa-me o futuro do chamado Cinema comercial americano. É de longe o mais consumido no mundo todo. Enquanto bombas como Battleship e Transformers (da mesma produtora) fazem bonito nas bilheterias (até dia 20 de maio Battleship só perdia para Os Vingadores), não é raro ver filmes um pouco mais alternativos e menos badalados passarem batidos, com exibição em poucas salas,  campanhas publicitárias apagadas e como consequência disso, bilheterias pouco expressivas. É com frequência que saio da sala de Cinema pensando “todo mundo deveria ver esse filme...” por ele ser importante por ou motivo ou outro, mas na maioria das vezes, esses são os que quase ninguém vai ver. Não porque eles sejam ruins ou chatos, mas porque não dispõem da arma ($$) publicitária que os Transformers/Battleships da vida têm. Eu tenho consciência de que sempre será assim: filmes mais ambiciosos artisticamente terão bilheteria menor do que os feitos para serem blockbusters. Mas será que essa diferença não pode ser um pouco diminuída?

Fico triste quando escuto alguém antes de mim na fila da bilheteria do Cinema perguntar para o atendente “qual é o filme em 3D passando?” Onde está o senso crítico dessa pessoa? Ela está disposta a consumir o que quer que seja simplesmente porque alguém disse pra ela que ver filmes em 3D é legal? E se for alguma besteira do Michael Bay ou do Rob Schneider em 3D, será que não importa o quão fútil e lixo seja, contanto que seja 3D? Quantos por cento da população pensam desse jeito? São perguntas como essas que passam pela minha cabeça nessas horas. Não sou um chato e não quero ver toda a população mundial pagando de cult só querendo ver os filmes do P. T. Anderson e Roman Polansky. Quero ver filmes bobinhos também pra me divertir, mas mesmo quando for assim, quero pelo menos não ter minha inteligência ofendida e nem ser bombardeados com conceitos ruins como machismo, patriotismo cego, xenofobia, racismo e homofobia como costuma muitas vezes acontecer com filmes medíocres. E mais do que tudo, gostaria de ver as pessoas distinguindo a diferença entre arte ruim e boa, e assistindo a TODO tipo de cinema, mas depois da sessão, discutindo com os amigos aquilo que acabaram de ver e transformando o filme em conceitos e ideias boas e aproveitáveis para suas vidas.

quarta-feira, 18 de abril de 2012

Titanic em 3D. É mesmo necessário?

Não gosto da ideia de converter filmes rodados em 2D para 3D. A linguagem 3D é relativamente nova, mas uma coisa já é muito clara: ela mudou conceitos básicos na concepção estética dos filmes. Como exemplo com relação ao campo e contra campo e a predominância de planos abertos no 3D em detrimento de planos fechados, só para citar alguns. A conversão de filmes para 3D só tem servido como uma muleta comercial, para atrair mais público. Pessoas (acredite ou não, eu já vi isto acontecer) chegam à bilheteria do cinema e perguntam “quero o ingresso do filme em 3D que está passando”... Enfim, esta pessoa em questão, que é uma fatia considerável do público, ignora completamente a obra que está prestes a assistir e encara o cinema como um simples entretenimento rápido e relativamente barato, algo que se assemelha a um parque de diversões, talvez. Coisa que acho absurda.

Cinema é sim entretenimento. E se um dia deixar de ser vai perder totalmente a graça. Mas antes disso é Arte, e transmite conceitos, ideias, emociona a audiência entre outras coisas. Isso nos leva aos relançamentos de grandes blockbusters em 3D, como Star Wars – Ameaça Fantasma e Titanic. É de se esperar que as duas trilogias completas de George Lucas sejam lançadas novamente no cinema em 3D e também há boatos de que O Senhor dos Anéis irá pelo mesmo caminho. Assisti à Ameaça Fantasma e Titanic convertidos, mas não pelo fato de achar relevante vê-los assim, mas sim por simplesmente aproveitar a oportunidade para ver ou rever esses longas na telona. Porém um fato permanece: se um filme foi concebido em 2D, ele deve ser exibido em 2D, não em 3D. Alguns falam que isso é mutilar a obra original, o que de certa forma eu concordo, mas acho também o uso do termo um pouco exagerado.

Voltando ao filme... Titanic se tornou tão popular que hoje em dia é comum encontrar pessoas que gostam de odiá-lo pelo simples prazer de ser diferente de todo o resto do mundo que ama o filme. Mas negar a qualidade do filme é algo que acho patético. A história de amor, mesmo sendo um tanto clichê (rapaz pobre se apaixona por moça rica), é contada de forma incrível por James Cameron. Todos os quadjuvantes têm seu momento em cena bem aproveitado e têm sua importância. O que poderia ser simplesmente um filme sobre um naufrágio, é um filme sobre pessoas, que emociona do início ao fim, e por isso se faz importante. Sem contar em todo o avanço em tecnologia de efeitos visuais que Cameron desenvolveu e trouxe para a indústria cinematográfica com o filme.

Confesso que assistir ao longa no cinema (acredite, eu só tinha visto em casa) foi incrível. O 3D é simbólico. Mas pela primeira vez chorei e passei um bom tempo depois da sessão pensando no que eu acabara de ver e na experiência cinematográfica que James Cameron proporcionou.

Fiquei muito feliz em ver a sala de Cinema cheia. Isso significa, como minha amiga Daniele disse, que o filme tem algo, independente do que os haters hoje em dia falem. Mas em um ponto eu tenho que concordar com os haters: agente podia ter passado sem a música da Celine Dion.

O Poderoso Chefão

Autor: Mario Puzo

Edições Best Bolso, 2011. 655 páginas.

Eu vou lhe fazer uma proposta que ele não poderá recusar.” Essa frase icônica resume bem o centro da narrativa de O Poderoso Chefão, de Mario Puzo. Don Corleone pode ser considerado um gênio da estratégia e dos relacionamentos interpessoais. Acompanhar no livro a trajetória de sua família e seus amigos na luta por manter a hegemonia sobre a máfia (palavra que eles nunca usam, trocando-a por Família) de Nova York foi uma experiência muito interessante e um estudo de personagens incrível.

Falar do livro sem falar da trilogia dirigida por Francis Ford Coppola é impossível. Puzo e Coppola adaptaram para o cinema a saga dos Corleone de forma mais bem sucedida e substancial do que o livro. Os filmes abrangem um ciclo que começa com Vito Corleone e se fecha com Michael seu filho de forma brilhante (como já escrevi nos textos sobre a Parte 1, 2 e 3). O livro não se preocupa em fechar esse ciclo, e às vezes assume uma cronologia não linear, que pra mim não tem muito propósito narrativo, chegando até a atrapalhar em alguns momentos.

Um exemplo dessa falta de linearidade é quando certo personagem é baleado na rua pelos seus inimigos e só tomamos conhecimento do fato através de um parente seu que lê a manchete no jornal, para só depois Puzo descrever o incidente com detalhes. Não sei se foi porque eu já conhecia a história profundamente, mas essa falta de linearidade não causou nenhum impacto em mim. Somente soou como uma estética literária um pouco sem propósito. Outro ponto que me incomodou um pouco foi o excesso de atenção que Puzo dedica a personagens secundários, que na minha opinião não mereciam muito destaque e tantas páginas. Um desses exemplos é Johnny Fontane, a celebridade de Hollywood pertencente à Família. Puzo gasta vários capítulos com ele, seu primo a quem o próprio ajuda e à sua ex esposa e filhas. Esse arco narrativo rende até alguns momentos interessantes, mas nada que contribua muito para o desenvolvimento da história da Família Corleone em si, soando como um filler no livro.

Excluindo as partes desnecessárias e mal construídas, o livro é um estudo incrível de personagens. Don Vito Corleone é uma das figuras mais complexas e interessantes da literatura/cinema. O seu poder de influência nas várias camadas da sociedade, política e economia é impressionante. Eu pude compreender melhor como eram os planos de ação e as estratégias de Don Vito lendo o livro. Puzo dedica muito tempo a isso, coisa que eu gostei muito. Como ele estabelecia seu poder e sua influência através das relações pessoais e o respeito por aqueles da sua Família. Logo nas primeiras páginas já temos ideia dos princípios e da lógica de Don Vito. Bonasera pede sua ajuda, mas Don Vito o lembra do fato que ele não o respeita como pessoa. Ele apenas quer vingança e quer usar o poder de Don Vito para isso. Ele nunca “pediu para o Don ser padrinho de seus filhos” e nunca o “convidou para ir a sua casa como um amigo...”. Entendemos os princípios com que o Don governa os seus familiares e amigos.

Mesmo sendo um homem criminoso e cruel, matando quando se faz necessário, Don Vito obedece ao seu próprio código de conduta e caráter, considerando uma desonra agir fora de seus princípios. Até mesmo o centro da narrativa, que é a resistência da Família Corleone com relação às outras Cinco Famílias para entrar no tráfico de narcóticos exemplifica isso. A justificativa de Don Vito para sua relutância é que esse tráfico “destruirá as famílias”.

Quando Michael assume a liderança da Família logos após Sonny, percebemos como Don Vito e todo o seu conhecimento do sistema e sua sabedoria fazem falta. Chegamos até a temer seriamente pelo futuro da Família e o seu equilíbrio. Mesmo ela resistindo às outras cinco Famílias, eles preservarão a mesma integridade de antes, sob o domínio de Don Vito?

A escrita de Puzo é muito fluída e prende a atenção. Mesmo nas partes que considerei “menos interessantes”, como disse antes, não deixaram de me atrair de um modo ou de outro. Todo o universo criado por ele e os personagens são muito cativantes e instigantes. O livro nunca é chato. Os arcos narrativos se completam e se desenvolvem com muita inteligência. O estado emocional e psicológico do qual Michael começa no início da história e até onde ele chega ao fim é incrível. Ele e Don Vito são de fato os protagonistas.

Outra parte que me tocou muito foi conhecer o passado do Don Vito na Cicília e o início de sua vida na América. O segundo filme mostra isso, mas não com a riqueza de detalhes do livro. Foi inesperado e muito prazeroso acompanhar a sua jornada e sua transformação no homem que já conhecíamos.

Ler o livro só me fez admirar mais o trabalho de Puzo e Coppola no Cinema e me apaixonar mais pela história e os personagens.

Nota: 8,0

quarta-feira, 11 de abril de 2012

A better life (Idem)

A better life (Idem) – EUA

Direção: Chris Weitz

Roteiro: Eric Eason e Roger L. Smith

A Better life é a prova de que o roteiro cinematográfico é tão importante quanto à direção. Se isso não fosse verdade, seria impossível que o mesmo diretor que dirigiu o vergonhoso Lua Nova (New Moon – 2009) fosse responsável por esse ótimo A better life. É calor que o diretor pode ter amadurecido e aprendido com o tempo e experiência, mas não foi o caso, visto que Lua nova é do recente ano de 2009. O roteiro de A better life é de fato muito sólido, os personagens são bem definidos e a história sabe aonde quer chegar e o que quer provar para a audiência. A direção de Chris Weitz simplesmente pega o material original e transforma num filme tocante.

Carlos Galindo (Demián Bichir) é um imigrante mexicano que vive ilegalmente nos Estados Unidos com seu filho. Ele trabalha para outro compatriota mexicano prestando serviços de jardinagem. Quando seu chefe consegue juntar dinheiro suficiente para voltar para seu país, Carlos decide pegar dinheiro emprestado com sua irmã para comprar a caminhonete de seu chefe. A caminhonete é roubada; ele tenta recuperá-la ao mesmo tempo em que tem que lidar com seu filho rebelde prestes a entrar para a gang local e ainda tenta escapar da Polícia dos Estados Unidos para não ser deportado, e se ver obrigado a viver longe de seu filho.

Com essa premissa que poderia levar o filme a ser um dramalhão digno de uma novela mexicana, Weitz escapa disso e adota a sensibilidade como guia para contar sua história. Desde os primeiro momentos vamos tomando conhecimento da rotina de Carlos no trabalho e seu relacionamento complicado com seu filho; tudo com pequenos acontecimentos e poucos diálogos. Para isso, o desempenho de Demián Bichir e José Julián como seu filho são incríveis e imprescindíveis. O primeiro consegue mostrar que cada coisa que faz durante o seu dia é dedicada ao seu objetivo de dar uma vida melhor ao sue filho. Mas ao mesmo tempo todo o seu esforço de trabalhar muitas horas por dia o faz passar pouco tempo ao lado do garoto, o que nos leva a performance de José Julián. O garoto Luiz vivido por ele é irritante na maior parte do tempo por causa do seu desprezo com o pai e sua tendência à rebeldia e criminalidade. É muito claro para todos nós, expectadores da história, que tudo que Carlos fazia era para o bem de seu filho, menos para o próprio garoto. Mas ele não é só um adolescente rebelde sem causa. Ao longo da projeção percebemos que o que Luiz queria era passar tempo com seu pai assim como eles passavam em sua infância e ter um pouco de sua atenção. Na conversa final do terceiro ato do longa isso fica bem claro. Senti-me muito tocado. Fez-me pensar que quase todos os pais são assim: mesmo cometendo erros, como qualquer ser humano, no fundo eles sempre querem o melhor para seus filhos.

Outro momento que me tocou muito foi quando Luiz pergunta a seu pai durante uma feira frequentada por mexicanos “por que todas essas pessoas pobres e imigrantes ilegais têm filhos?”. O olhar de decepção e mágoa nos olhos de Carlos expressam tudo o que ele sentia. Mais tarde ele tem a oportunidade de explicar a Luiz o seu motivo de ter um filho.

A trilha sonora do sempre talentoso Alexandre Desplat pontua a história de forma discreta e bem colocada. A música não chama atenção para si, como em muitas produções, mas está ali, nos momentos certos na medida certa.

A better life faz com que aqueles que assistiram à história de Carlos e Luiz em forma de arte passem a olhar o mundo e as pessoas de forma um pouco diferente. Afinal, não é esse o objetivo de toda arte?

Nota: 9,0

terça-feira, 10 de abril de 2012

Cavalo de Guerra (War Horse)

Cavalo de Guerra (War Horse) – EUA/Reino Unido – 2011

Direção: Steven Spielberg

Roteiro: Lee Hall e Richard Curtis, baseado no livro homônimo de Michael Morpurgo

Quem bom que no ano passado Spielberg lançou o ótimo As aventuras de TinTim, porque se seu prestígio como artista dependesse somente desse fraco Cavalo de Guerra, ele estaria seriamente comprometido. O diretor apostou todas as suas fichas no seu drama de guerra, visto que das duas últimas vezes em que fez isso com A lista de Schindler e O regate do soldado Ryan, foi bem sucedido com o público, crítica e premiações (dois Oscar’s de melhor diretor).

Cavalo de Guerra conta a história do cavalo do título, Joey, que é comprado num momento de insanidade por Ted Narracott (Peter Mullan) um fazendeiro alcoólatra. Seu filho Albert (Jeremy Irvine) se encanta pelo cavalo desde o primeiro momento que o vê. Ele passa a se dedicar a cuidar do animal e ensiná-lo a arar a terra para tentar salvar a fazenda do seu pai e o futuro de sua família, mesmo Joey não sendo apropriado para o serviço. Com a plantação arruinada por uma tempestade, Ted é obrigado a vender o cavalo para que este seja usado na Primeira Guerra que acaba de começar. Albert promete a Joey que irá procura-lo e trazê-lo de volta para casa. É aí então que acompanhamos a história de Joey e os vários donos por quem ele passa e seus infortúnios durante a guerra.

Centrar a narrativa em um animal é algo perigoso. Animais são inexpressivos e não falam. Quando o roteiro é raso e a direção de Spielberg é genérica o resultado é pior ainda. Um dos maiores erros que um diretor pode cometer, e que Spielberg tem a ligeira tendência a fazer, é tentar manipular a audiência. Se uma história emociona, faz rir ou assusta, isso tem que acontecer de forma honesta e porque a história possui essa força naturalmente e os elementos do filme (direção, atuação, etc) possuem autenticidade. Spielberg tenta fazer o expectador vir às lágrimas o tempo todo, com cenas que às vezes beiram o melodrama. E é aí que a trilha de John William colabora para o fracasso. Ele tenta criar temas engraçadinhos ou dramáticos de forma completamente forçada. Fiquei me perguntando onde estava o gênio que criou os temas de Star Wars, Indiana Jones, Contatos imediatos de Terceiro Grau, Memórias de uma Gueixa, Harry Potter, Star Wars e de tantos outros filmes? Cavalo de guerra não possui uma única melodia marcante, apenas algumas que chegam a irritar.

Mesmo sendo irregular, consegui me envolver em alguns momentos da história, principalmente no terceiro ato do longa, afinal Spielberg não é qualquer diretor. Um momento específico envolvendo uma cerca me tirou o fôlego. Elogios devem ser dados à parte técnica do longa. A fotografia é linda e tem função na narrativa, o que é mais importante. São extremamente diferentes os momentos cheios de cores vivas que mostram Albert feliz em sua fazenda com seu cavalo e os momentos quase sem cor alguma na Guerra, dentro das trincheiras e nos momentos de batalha. A direção de arte recria a Inglaterra da década de 10 de forma impressionante.

Como a maioria de filmes como animais, Spielberg não conseguiu escapar do vício de criar cenas nas quais a câmera mostra a reação “engraçadinha” dos animais à determinadas gags cômicas, coisa que me incomoda profundamente. O filme não exigia tal coisa, sendo mais coerente em uma comédia pastelão. Pense que se talvez o roteiro se concentrasse em Albert e sua busca pelo seu cavalo durante a Guerra, a história seria mais interessante. Acompanhar Joey e seus vários donos assumiu um caráter episódico, o que para um filme é fatal. E os donos de Joey não passam de caricaturas, não seres humanos com personalidade e complexidade. Isto é claro devido à falta de tempo para desenvolvê-los. A amizade de Joey e outro cavalo que se tornou seu “companheiro” não convence muito. Porque afinal de contas uma amizade do tipo como foi retratada (entre dois animais) todos sabem que é impossível de acontecer, por mais valoroso que seja o cavalo. E nem o enorme afeto de Albert por seu cavalo fica muito bem explicado pra mim. Mesmo amando a animal, não vejo tantos motivos para ele ter levado sua busca até as últimas consequências.

No fim, fazendo uma referência vazia e desnecessária à E o vento levou, Spielberg tenta sua última cartada em fazer o público chorar. Comigo não funcionou.

Nota: 6,5

domingo, 8 de abril de 2012

Prazer estendido

Sei que a declaração que estou prestes a fazer é vergonhosa, mas tenho que fazê-la. Somente esse ano eu vi a versão estendida da trilogia O Senhor dos Anéis, já lançada há bastante tempo por Peter Jackson. A verdade é que eu nunca tive o interesse de procurar ou o tempo, mas acho que foi falta de cuidado mesmo, por achar que essas cenas a mais, que eu não imaginava que eram tantas, em nada acrescentariam à obra original lançada nos cinemas. Mas eu não poderia estar mais errado.
Essas versões acrescentam em média em torno de trinta minutos a cada filme, sendo um pouco mais do terceiro, que tem um total de quatro horas de duração (uau!). Somando tudo, dá mais ou menos uma hora e meia a mais de filme para a trilogia. Por fim, fiquei me perguntando: como não pensei em ver isso antes?! Visto que sou muito fã dos livros, que considero um dos meus favoritos e o mundo considera um dos mais influentes do século passado, e também amo muito os filmes e o trabalho de Peter Jackson. Para mim, Tolkien e Jackson são gênios em suas respectivas artes.
Quando assistia às versões de cinema da trilogia, sempre me lembrava de fatos que existiam no livro, mas não no filme, mas nunca tinha pensado que Jackson na verdade tinha filmado muitos deles, mas que por motivos óbvios de cortes do estúdio e de decisão de Jackson também (poucas pessoas vão querer assistir um filme de 4 horas de duração), haviam sido excluídos na edição final.
Para citar alguns desses fatos que mais me emocionaram ou chamaram a minha atenção: a introdução sobre os hobbites e seu modo de vida presente no prefácio do livro, as cenas extras em Minas Mória, os presente de Galadriel para a sociedade, os detalhes do convívio de Merry e Pippin com Barbárvore, a preferência de Lord Denethor pelo filho Boromir ao invés de Faramir mostrada com cuidado em uma linda seqüência, a conversa da Sociedade com Saruman derrotado (me lembro que no livro existe um capítulo só para isso), as cenas extras da jornada de Frodo e Sam em Mordor, as desventuras de Aragorn, Legolas e Gimli nas Sendas dos mortos, os takes incríveis da batalha nos portões de Gondor, o relacionamento de Faramir e Eowyn nas Casas de Cura, e muitos outros. Praticamente todas as seqüências sofreram cortes, e para aqueles que já viram muitas vezes a versão de cinema, fica fácil identificar até mesmo um único frame diferente.
Confesso que para muitos, a versão mais curta já parecia muito longa, o que de fato é. Então assistir a versão entendida de algo que já era longo pode parecer uma idéia absurda. Creio que a versão mais longa seja só para os fortes. Brincadeiras a parte, para os fãs da obra como eu, uma hora e meia a mais da Terra Média acompanhando uma história tão incrível com personagens que aprendemos a amar não parece tão má idéia assim.
Deixa eu fica mas um pouco na Terra Média?”. (Frodo Bolseiro para Gandalf)

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Fúria de Tirãs 2 (Wrath of the Titans)

Fúria de Tirãs 2 (Wrath of the Titans) – EUA – 2012

Direção: Jonathan Lieberman

Roteiro: Basil Iwanyk e Polly Cohen Johnsen

Depois do remake já fraco, porém sucesso de bilheteria Fúria de Titãs em 2010, o estúdio teve o mal gosto de realizar esse Fúria de Titãs 2, ainda mais apagado que o original.

O enredo do filme gira em torno de uma crise que acontece com o mundo dos deuses, visto que os humanos não oram mais por eles (assumindo que a oração na Grécia antiga era da forma que é para os cristãos nos dias de hoje). Enfraquecidos pela falta de crença dos humanos, os deuses são subjugados por Cronos, que libera os titãs sobre o mundo dos humanos e tenta tomar o poder absoluto entre os deuses, capturando Zeus (Liam Neeson). É aí que entra em ação Perseu (Sam Worthington), protagonista do longa de 2010. Dez anos depois dos acontecimentos do primeiro filme, Perseu leva uma vida normal criando seu filho em uma vila e trabalhando como pescador. Perseu se compadece de seu pai e parte numa missão de resgate.

Nem mesmo uma missão tão nobre como a de Perseu, resgatar o pai, consegue sustentar a narrativa nas duas horas de filme. Perseu não era próximo de seu pai e não nos importamos com o destino dos dois e muito menos com o sucesso da jornada, que deveria ser a veia central do filme. Nem mesmo a relação de Perseu com seu filho, que deveria servir de contraponto para a relação de Perseu e Zeus, não exibe força nenhuma. E no caminho, Perseu conhece a bela Andrômeda (Rosamund Pike), que desde o primeiro momento em que os dois se entreolham, temos a plena certeza que ela se tornará o interesse romântico do herói ao longo do filme. A relação dos dois é artificial, o que faz com que o inevitável beijo no fim da projeção seja sem graça e óbvio.

É difícil entender a motivação de cada personagem se ela existe. Excetuando a de Perseu, que é resgatar seu distante pai, são rasos os motivos de cada um para estar naquela jornada. Esse erro é fatal para o sucesso da produção, uma vez que a morte de qualquer um dos personagens não acarretaria em quase nenhuma reação no expectador. Não a que deveria causar pelo menos. O único alívio fica por conta de Agenor (Toby Kebbell), que tem um personagem ligeiramente divertido e um pouco interessante. Fiquei curioso para saber um pouco mais de sua história.

Sam Worthington se apresentou como uma surpresa agradável em Avatar (2009). Aqui ele não pode fazer muito com seu personagem vazio num enredo furado. Perseu é inexpressivo e não cativa como deveria. O resto do elenco de encontra na mesma situação. Inclusive os sempre talentosos Ralph Fiennes e Liam Neeson. E foi difícil não pensar no Lord Valdemort de Harry Potter ao ver Fiennes em cena. Afinal, foram muitos anos no papel. O que tem acontecido com Hollywood? Remakes sem graça têm sido produzidos um após o outro e atores talentosos têm se entregado a projetos medíocres. Enfim...

Não entendo muito de mitologia grega, mas o pouco conhecimento que tenho me permite dizer que Fúria de titãs 2 faz uma miscelânea dos elementos da mitologia e o resultado não é muito bom. Se o drama e a ação ainda funcionassem, seria um pouco mais perdoável devassar toda a cultura antiga de um país, mas não é o caso.

A direção de Jonathan Lieberman é obvia e não tem nada de novo, chegando mesmo a beirar o ruim em algumas cenas, como aquela dentro do labirinto que supostamente deveria ser quase impossível de ser transposto. A sequência é confusa, a câmera fica trêmula e trepidante o tempo todo, os cortes são rápidos demais, impedindo que qualquer um entenda o que acontece na tela, e por fim, depois de muitas paredes andarem de um lado para o outro, o chão de mover e buracos serem abertos, sem mais nem menos eles chegam ao centro, onde supostamente era impossível de se alcançar. O uso do 3D não apresenta nada de novo para a linguagem, servindo apenas como uma muleta para atrais mais bilheteria.

O primeiro filme 2010 merecia ser visto por se tratar de um remake de um filme que se tornou cult. Deste eu não posso dizer nem isso.

Nota: 4,0

terça-feira, 3 de abril de 2012

Millenium – Os homens que não amavam as mulheres

Millenium – Os homens que não amavam as mulheres

Autor: Stieg Larsson

Editora Companhia das Letras, 2008 – 522 páginas

Foi com empolgação que comecei a ler o incrível Millenium – Os homens que não amavam as mulheres depois de ver no ano passado o tão incrível filme baseado no livro, dirigido por David Fincher. Logo nos primeiros capítulos eu percebi o que atraiu Fincher e o levou a trazer o material (já filmado na Suécia) para as telas e o que transformou o a trilogia Millenium em best seller. A escrita de Stieg Larsson é intrigante, inteligente e muito criativa. E acima de tudo honesta com o leitor, contando a história (muito boa) de forma bem estruturada e clara sem o uso de ferramentas (muletas, pode-se dizer) que tentam prender a atenção dos leitores, como faz Dan Brown, e que acabam por disfarçar uma história fraca.

Eu nunca imaginaria que o mundo do jornalismo econômico investigativo pudesse ser tão interessante e ao mesmo tempo tão rico, rendendo situações dramáticas muito intensas e conflitos morais e éticos tão bem trabalhados por Larsson, sem em momento nenhum pender para o moralismo, o que seria tão fácil de acontecer, ou soar monótono.

Mikael Blomkvist e Lisbeth Salander são personagens riquíssimos e muito interessantes. O tempo todo o leitor se encontra curioso para saber qual será o próximo passo de cada um, visto que as mentes investigativas dos dois trabalham de forma tão parecida e ao mesmo tempo tão diferentes, levando a investigação do assassinato de Harriet Vanger, que é o centro da narrativa, em cada capítulo a ótimas reviravoltas. A pesquisa a cada momento fica mais instigante. A narrativa é muito bem amarrada do início ao fim. Mesmo sendo complexa, cheia de personagens, muitos fatos e mudanças de foco ao longo do tempo, o leitor acompanha sempre com clareza tudo o que ocorre, e entende cada passo e movimento da dupla de protagonistas.

Muitos podem confundir Millenium – Os homens que não amavam as mulheres com uma história do tipo “quem é o assassino”, a exemplo dos livros de Agatha Christie, mas Millenium é muito mais do que isso. Como já disse, é focado no mundo do jornalismo investigativo econômico e de fato se aprofunda muito no assunto. Mas ao mesmo tempo acompanhamos a investigação do desaparecimento de Harriet que ocorreu a quarenta anos atrás e que tem um número considerável de suspeitos na família Vanger, e principalmente é um incrível estudo de personagens. Ao fim do livro me senti conhecendo profundamente Mikael e Lisbeth e também a enorme galeria de quadjuvantes de maior ou menor importância. E é aí que Larsson mostra seu talento. Com poucos parágrafos que seja que ele dedique a alguém, ele consegue traçar uma análise profunda da personalidade e caráter do mesmo. Sem muitos floreios, com simples fatos que ocorrem, conversas e pensamentos descritos. 

Estou ansioso par ler os outros dois títulos da trilogia e por que não, vê-los no cinema também. Dirigidos por David Fincher, é claro.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

The Walking Dead - 2ª Temporada (parte 1)


Criador: Frank Darabont

Baseado no grafic novel de Robert Kirkman

Spoiler alert!

Depois da impecável Primeira temporada de apenas 6 episodios, The Walking Dead continua acompanhando a saga de um grupo de humanos sobreviventes de uma epidemia que transformou quase toda a humanidade em zumbis que se alimentam de carne humana e de outros animais. Baseado no grafic novel de Robert Kirkman, a série é um ensaio sobre o comportamento humano em condições extremas e as formas que este comportamento pode assumir no âmbito religioso, intelectual, social e emocional na vida daqueles personagens.
O roteiro desta segunda temporada (parte 1) se concentra na busca da garotinha Sophia que desapareceu e na chegada do grupo à fazenda de Hershel onde Rick pede socorro depois que o seu filho foi baleado por acidente.
Os questionamentos envolvendo a persistência na busca da garota ou a desistência da mesma rendem muitas discursões interessantes e traz à tona o conflito entre as personalidades de Shane e Rick, que mesmo sendo tão amigos, tem formas tão diferentes de ver o mundo depois da epidemia e até mesmo antes dela, como mostra uma conversa entre os dois relembrando os tempos de high school de ambos. Outro conflito muito interessante e relevante para a história (que eu já estava sentindo falta na primeira temporada) é a forma como Hershel e os moradores de sua fazenda vêem os errantes: não como simples mortos vivos a procura de alimento, mas como pessoas doentes que devem ser preservadas até que se encontre a cura. E isso é revelado de forma chocante, quando descobrimos que o celeiro da fazenda está repleto de errantes, incluindo amigos e conhecidos de Hershel e principalmente sua esposa e seu enteado.
Fica clato a diferença de interesses entre Rick e Hershel. Enquanto o primeiro quer um lugar livre de zumbis onde ele pode viver tranquilamente com sua família, o segundo nutre a esperança de recuperar a parte de sua família contaminada e pensa que os errantes devem ser tratados como humanos, e não mortos vivos que devem ser aniquilados. A racionalidade de Rick entra sempre em confronto com a religiosidade de Hershel, e um, de certa forma, acaba influenciando o outro, visto que o interesse de ambos é o mesmo: viver feliz em família. Mesmo que o sonho de Hershel, e até mesmo de Rick, pareça impossível naquela realidade.
O maior mérito dos roteiristas, diretores e produtores é criar uma linha narrativa contínua para o seriado. Não temos uma deixa no fim de cada episódio que leva o espectador a ter vontade de assistir ao próximo, como acontece com muitas séries, e o que soa desonesto pra mim. A história simplesmente transcorre através dos episódios, e se ela prende a atenção é porque é interessante, honesta e importante por si só, não por causa de recursos narrativos batidos e inaceitáveis nos dias atuais numa série dramática deste nível.
Os personagens e seus dilemas são tratados de forma imparcial e humana, nunca pendendo para uma forma de pensar ou analisar a situação. Vide a mulher que descobre que está grávida e fica em dúvida se quer ou não ter a criança naquele mundo, ou o homem que se vê obrigado a matar um companheiro para salvar a sua própria vida e a do garoto Carl, ou Rick e seu dilema de liderar o grupo a buscar a gartotinha Sophia ou não; assim é com todos os personagens e situações. Por isso a série é um ensaio sobre o comportamento humano; assim como o filme do mesmo produtor/diretor Frank Darabont O Nevoeiro e o filme de Fernando Meireles Ensaio sobre a cegueira. The walking dead consegue ser ambiciosa quase ao nível cinematográfico desses dois títulos, só não o é pelo fato de ser uma série de TV e estar limitada ao que a linguagem de TV exigue. Mas ainda assim, The walking dead é uma das séries cinematográficas que estão no ar atualmente nos EUA, e forma ao lado de Dexter, as duas melhores que eu assisto.
O desfecho do sétimo episódio é o clímax que estava sendo preparado nos seis episódios anteriores que amarra a história e a deixa coesa, dando ao espectador a impressão (verdadeira) de que nada que aconteceu ao grupo foi por acaso. Tudo levou àquela conclusão. Agora só cabe morrer de curiosidade pra saber o que aquele terrível fato causou no grupo e o que está por vir.

Nota: 10